domingo, 28 de fevereiro de 2010

Castello Banfi Rosso di Montalcino 2006




Agora que o calor está deixando espaço ao primeiro frio torna-se possível e bastante agradável saborear um bom tinto. Este Castello Banfi descansava junto com outros conterrâneos há mais ou menos dois anos, lembrança de uma viagem na minha terra natal, na minha amada Firenze. Devo admitr que tenho a tendência a considerar alguns vinho "especiais", um pouco por preguiça e um pouco pelas lembranças que me trazem, de forma que fica difícil tirá-los da prateleira. É preciso uma ocasião especial.
Sexta-feira voltei a falar com um grande amigo ficado afastado numa daquelas temporadas de ausência que por vezes a vida impõe e sobre as quais não temos controle. Pouco importa. Quando os sentimentos são verdadeiros, podemos ficar distantes o tempo que for, a amizade continua intacta da mesma forma como foi deixada.
- Passa em casa hoje à noite, vamos tomar um vinho - digo eu.
- Ok - responde ele.
Quer ocasião melhor?
Assim que ele chegar abro a garrafa, meio apressadamente e em cima da hora, contrariamente aos meus hábitos (sempre deixo o vinho "arear" pelo menos uma meia hora). Deu certo.
Este vinho pode ser considerado o irmão menor do mais famoso Brunello, um dos mais conhecidos vinhos italianos. Os dois são produzidos a partir de uvas Sangiovese grosso. O rosso é envelhecido por 12 meses em carvalho e outros 6 meses em garrafa antes de ver as prateleiras das lojas. É considerado um vinho mais "fácil" que o Brunello e que pode ser tomado "jovem", à diferênça do irmão maior que dá o melhor de si depois de anos ou décadas de guarda.
Tomo cuidado em não estragar a rolha que dá sinais de querer partir ao meio. Missão cumprida, decanto e já está na hora de servir.
O Castello Banfi è de um vermelho rubi muito escuro, cor que normalmente me dá uma indicação sobre a consistência do vinho e me deixa tranquilo; com seus reflexos roxos, fica bonito no copo.
Ao nariz não excele (também não o deixei respirar muito), não é uma "bomba de frutas" argentina ou chilena, mas são evidentes as notas de ameixa e cereja e um leve toque de baunilha, que em momento algum se sobrepõe ao bouquet.
Na boca ele tem um ataque firme, taninos sedosos, boa concentração, elegância e firmeza ao mesmo tempo. Ótimo retrogosto e final longo e agradável.
Não evoluiu muito, até porque os 750 ml evaporaram muito rapidamente, mas deixou todo mundo satisfeito e pessoalmente fiquei com vontade de ter mais umas garrafas deste Rosso pra continuar a agradável conversa, num fundo musical de grandes vozes líricas (Maria Callas, Beniamino Gigli).
Enfim, fui dormir feliz, um pouco pelo vinho e muito pela reaproximação do meu grande amigo Enio.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Jazz. Onde?

Que o jazz seja uma arte menor não há a menor dúvida. É suficiente ir à um megastore tipo Saraiva ou Fnac para dar-se conta da limitadíssima quantidade de títulos de jazz disponíveis.
É verdade que a indústria discográfica está vivendo um momento de crise, especialmente por causa da música digital facilmente acessível via internet. Se isso vale para o pop e o rock,que sempre dominaram as vendas, quanto mais triste a situação para o nosso caro bom e velho jazz, que sempre contou com um restrito número de poucos (mas bons) aficionados.
Se excluirmos as re-edições, remasterizações e reprensagens de clássicos (será que alguém sentia a necessidade de uma enésima versão de "Kind Of Blue", com camiseta de brinde??), se tentarmos ir um pouco além dos mesmos nomes de sempre (Miles, Trane, Parker, Ellington, etc.) e fora o jazz-pop comercial das várias cantoras estilo Norah Jones, surge inevitável a pergunta: "onde está o jazz hoje? Será que ele morreu mesmo?"
A triste realidade é que hoje, para um músico de jazz, é muito difícil achar uma gravadora que invista nele bancando todos os custos. Jazz não dá lucro. Tanto que, como escrevi na resenha do cd "The End Of A Love Affair", existem nos EUA músicos que para poder lançar seus projetos se veem obrigados a gravar por etiquetas estrangeiras independentes, muitas vezes japonesas ou europeias.
A Blue Note, desde sempre a principal gravadora de jazz, tem um acervo invejável, mas a maior parte dele é ocupada pelas re-edições do período de ouro (anos '50 e '60), o mesmo diga-se da Verve, e pior ainda a Columbia, hoje Sony, cujo catálogo jazz sempre foi bem mais limitado. Um discurso particular merece a ECM de Manfred Eicher, desde sempre dedicada a um jazz mais intimista e voltado para o mundo, cujo catálogo oferece uma escolha boa e diversificada.
Apesar disso, o jazz continua bem vivo, e é "ao vivo", especialmente nos locais das cidades americanas, mas também do resto do mundo, que os jazzistas fazem a música brilhar. E graças a Deus existem incontáveis pequenas gravadoras, quase sempre de propriedade de apaixonados, que se encarregam de impedir que esta forma de arte exale o último respiro.
E é justamente no catálogo de gravadoras como Palmetto, High Note, Concord, Criss Cross, Savant, Venus, Red Records e outras que é possível encontrar o jazz de hoje gravado por mestres veteranos desconhecidos ao grande público (Harold Mabern é um exemplo) ou novos nomes como Ted Nash ou Avishai Cohen.
É só procurar. Existe um mundo de jazz além de "Kind Of Blue" e "A Love Supreme" que quer e precisa ser descoberto e valorizado.
Boas audições à todos!

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

One For All - The End Of A Love Affair



Era uma vez Art Blakey e os Jazz Messengers...
Pois é. Escutando este cd, desde as primeiras notas tive a impressão de estar ouvindo um dos clássicos "Blue Note" anos '60 do saudoso baterista. De fato, o som é típico hard-bop e o formato, sexteto (trombone-sax tenor-trompete- piano-baixo e bateria), remete muito à formação do Messengers com Curtis Fuller, Freddie Hubbard e Wayne Shorter.
Nada de particularmente inovador portanto, mas bom e velho jazz como se tocava no período de ouro desta genuína forma de arte afro-americana. Música de qualidade, tocada por um sexteto muito competente.
O trombone em questão é o do Steve Davis, um passado não muito distante em uma das últimas versões dos Messengers, aqui no papel de porta-bandeira virtual dos Messengers de Buhaina.
O sax tenor é Eric Alexander, em anos recentes já aclamado pela crítica e autor de ótimos projetos como solista. O som dele por vezes lembra o do Trane, digamos fim anos '50, período Prestige. Articulado,moderno, como deve ser.
O timbre e o fraseado de Jim Rotondi, trompete, me lembraram muito Freddie Hubbard, um nome de qualidade quando se trata de trompete hard-bop.
David Hazeltine proporciona um acompanhamento de classe ao piano (interessantes as gravações dele em trio, também pela Venus) e contribui ao programa do disco com uma composição própria, "How Are You", construída sobre ritmos cubanos.
Completam impecavelmente a "cozinha" Peter Washington no contrabaixo e Joe Farnsworth atrás dos tambores.
No repertório além de composiçõs originais, alguns clássicos como "Skylark", e uma agradável surpresa, "Corcovado" de Tom Jobim, escolha que foge um pouco do repertório típico deste estilo. Pelo que me diz respeito, não lembro de alguma gravação de bossa nova por parte dos Messengers, que sem dúvida representam um sólido ponto de referência para o sexteto.
Curiosamente "One For All" é um super-grupo que grava em New York pelo Venus, um selo japonês, sinal evidente de quão difícil seja para os músicos de jazz, em tempos de crise da indústria discográfica, encontrar uma gravadora disposta a acreditar e investir neste tipo de projeto.
E os nipônicos conseguem realizar um trabalho em grande estilo, como nós, apaixonados, adoramos. Gravação "audiófila" em 24 bits com o sistema chamado Hyper Magnum Sound, um processo de masterização usado apenas pela Venus, arte gráfica cativante (as capas desta gravadora exibem lindas fotos de modelos em trajes provocantes, nada mal!) por um projeto musical muito bom que prova mais uma vez que o jazz ainda goza de boa saúde. Graças a Deus!