sexta-feira, 3 de agosto de 2018

DR VERITAS ACOUSTIC GUITAR STRINGS REVIEW


Uma das vantagens da globalização e da internet é que hoje é possível ter praticamente tudo ao alcance de um click. Depois de descobrir o site americano Stringsbymail, que entrega no Brasil por um frete inferior a muitos sites nacionais não tive dúvidas: comprar cordas no Brasil nunca mais! Além de poder comprar as melhores marcas, pela metade ou menos do preço temos também a chance de experimentar e adotar cordas de marcas que aqui no Brasil não são facilmente encontradas. Assim, na jornada rumo à corda ideal, resolvi dar uma chance para as DR VERITAS.
DR é um fabricante de cordas americano conhecido aqui no Brasil principalmente pelas cordas para baixo, mas na verdade o catálogo desta marca possui propostas muito interessantes para violão e guitarra também.
O que me instigou bastante a comprar as VERITAS foi a declaração de que estas cordas duram até 4 vezes mais comparado com as outras marcas graças a uma tecnologia que melhora a qualidade do fio interno (wire) resultando em intonação mais precisa e maior duração. As VERITAS Extra Light (0.10 - 0.48) são cordas handmade, feitas de bronze fosforoso e não encapadas. O que mais chama a atenção de imediato é um sustain longo e um timbre cristalino. Parece que estas cordas projetam o som muito mais que as Martin Marquis, só para dar um exemplo. Realmente fiquei impressionado com a claridade delas, tanto no strumming como no fingerpicking. Apesar de serem cordas extra-leves, achei elas um pouco duras ao toque. Esse foi o único defeito que encontrei, mas temos que reconhecer que a dureza é característica comum em muitas cordas de bronze e bronze fosforoso construídas com núcleo em forma hexagonal.
No geral posso afirmar que, como timbre e sustain, as VERITAS são as melhores cordas que toquei até agora. No quesito duração elas também são excelentes: estão tocando há mais de 2 meses e ainda tem ótima clareza e brilho. Meu único cuidado é passar uma flanela depois de tocar. Quanto à afinação, elas mantém bem.
Paguei pouco mais de US$ 7,00 nessas cordas e mesmo com o frete, comprando vários sets, o custo sai bem mais em conta do que comprar cordas aqui no Brasil, sem contar a diferença de qualidade!
Enfim, as DR VERITAS são um excelente jogo de cordas com timbre, sustain e durabilidade superiores.
Recomendo!

TIMBRE: 9/10
SUSTAIN: 9/10
TOCABILIDADE: 6/10
DURABILIDADE: 8/10

(Pós post) Esse jogo de cordas durou 4 meses antes de perder brilho e volume. Troquei por um jogo da S.I.T. (011-050) que avaliarei em seguida.

quinta-feira, 31 de maio de 2018

TUDO (OU QUASE) QUE VOCÊ PRECISA SABER SOBRE CORDAS DE VIOLÃO DE AÇO


COMO ESCOLHER AS CORDAS PARA O VIOLÃO

Quanto o tipo de corda usada pode fazer a diferença no som do violão?
Quais são as características que precisamos considerar ao comprar um encordoamento? Com que frequência precisamos trocar as cordas?
Esse post irá responder essas perguntas.

Antes de começar gostaria de dizer que essas considerações são frutos de experiência pessoal. Portanto elas refletem minhas opiniões e não constituem verdades absolutas. Até porque no exterminado mercado de instrumentos e acessórios, no final das contas muito é questão de gosto pessoal.
Dito isso podemos afirmar que as cordas, assim como outros acessórios (palhetas por exemplo) contribuem ao resultado final, ou seja o som que iremos obter do instrumento. Lógico que o maior responsável pelo som do violão é a madeira utilizada e a construção (cutaway, dreadnought, etc.). É claro que um violão construído com tampo em madeira maciça (solid top) terá um som mais encorpado e com mais projeção que um em laminado, assim como cada tipo de madeira traz características peculiares ao som.
Mas vamos às cordas. Existem três elementos fundamentais que é preciso avaliar na escolha do encordoamento:

1- MATERIAL
2- CALIBRE
3- CONFORTO
4- CONSTRUÇÃO


MATERIAL: no mercado das cordas para violão de aço existem inúmeras opções para todos os gostos. As cordas em BRONZE (80/20) são as mais antigas no mercado e são perfeitas para quem deseja um som forte e brilhante. Normalmente violões que possuem som quente, como os dreadnoughts da Martin ou da Taylor combinam bem com esse tipo de corda. São compostas de 80% de bronze e 20% estanho e têm cor tendente ao amarelo.

As cordas PHOSPHOR BRONZE possuem um som mais quente e menos metálico que as de bronze. Foram introduzidas no mercado pela D'Addario em 1974, e, apesar de mais recentes se tornaram rapidamente as mais populares. Sua composição é 92% bronze, cerca de 8% estanho e uma pequena porcentagem de fósforo e a cor é avermelhada. O fósforo tem o poder de oferecer proteção contra os elementos e isto resulta nas cordas phosphor bronze terem uma duração maior comparado com as de bronze. Normalmente combinam com violões cujo som tende ao brilhante, como os Takamine por exemplos, ou em geral violões em laminado, ajudando a equilibrar o som que carece de corpo nas baixas frequências.
Existem também as cordas "Silk And Steel" cuja característica é um som mais suave e uma menor tensão que as torna mais fácil de tocar, especialmente para quem toca fingerpicking. Em volta do fio de aço elas possuem uma camada de filamentos de nylon que dá uma sensação muito mais suave ao tato e que age como uma espécie de almofada amortecendo o som. Estas cordas são as que desgastam mais rapidamente.
Outra características que as cordas (tanto bronze quanto phosphor bronze) podem possuir é o revestimento (coating). Trata-se de uma camada de material protetivo que prolonga a vida útil das cordas, em alguns casos até 3 vezes a normal duração. Muitos porém argumentam que este revestimento tira um pouco do brilho das cordas. No fim, é mais uma questão de preferência pessoal.

CALIBRE: O tamanho das cordas é outro fator importante:
Os encordoamentos se dividem (podendo ter mínimas variações) em:

Extra light: .010 .014 .023 .030 .039 .047
Custom light: .011 .015 .023 .032 .042 .052
Light: .012 .016 .025 .032 .042 .054
Medium: .013 .017 .026 .035 .045 .056
Heavy: .014 .018 .027 .039 .049 .059

Cordas grossas possuem mais material para vibrar e portanto tocam mais alto. Mas ao mesmo tempo elas exercem uma tensão maior sobre o braço do violão resultando em cordas duras para tocar. São mais apropriadas para quem faz acompanhamento (strumming) e não muito para quem por exemplo está acostumado com a guitarra e quer usar o violão para fazer solos com bends, etc.
Cordas de maior tamanho também são indicadas para quem toca fingerpicking.
Cordas muito finas têm menor projeção do som, mas ao mesmo tempo também menor tensão sobre o braço do violão, sendo mais confortáveis de se tocar. Algumas marcas fabricam até cordas .009 para violão, no caso dos guitarristas mais radicais que não querem renunciar aos bends e aos solos rápidos.
Para quem é iniciante, um bom compromisso são as cordas .010, podendo eventualmente passar para .011 caso se deseje maior volume no som. Ao trocar as cordas procure sempre colocar tamanho correspondente a das cordas velhas. Caso contrário você terá que regular o braço do violão através do truss rod (por exemplo ao passar de um encordoamento .010 para um .011).
É bom usar cordas não muito grossas também em violões antigos ou vintage cujo braços possam sofrer com uma tensão muito alta.

CONFORTO: O conforto (Playability) é algo extremamente subjetivo e que depende de vários fatores, entre os quais largura do braço, tamanho das cordas, tipo de música tocada, etc. Portanto é impossível dizer que uma corda é ideal para todas as situações e para todo tipo de violão. É preciso ir experimentando cordas de tamanho, marca e material diferente, até chegar na corda que mais se aproxima do "ideal".

CONSTRUÇÃO: O padrão para cordas para violão de aço presentes no mercado é HEXACORE, ou seja, o filamento do núcleo da corda tem forma hexagonal. Este tipo de corda geralmente tem uma tensão forte e resulta dura ao tato. Mas existe outro tipo de corda, que só algumas marcas produzem e chamada de ROUND CORE, onde o filamento do núcleo é arredondado, para ter 100% de contato do fio envoltório com o filamento do núcleo, proporcionando alta sustentação e um som mais vintage. Esse tipo de corda costuma apresentar tensão menor a paridade de calibre, portanto resulta mais macia de tocar, possibilitando bends com mais facilidade.
Exemplos de cordas ROUND CORE são as MARTIN FX FLEXIBLE CORE SILK AND PHOSPHOR e as DR SUNBEAMS. São aconselhadas para iniciantes ou para quem passa do violão com cordas de nylon para as de aço e para quem deseja cordas mais macias que não machucam os dedos.


COM QUE FREQUÊNCIA PRECISAMOS TROCAR AS CORDAS?
Aqui também a resposta é: DEPENDE. Se você toca muito e faz shows ao vivo é importante que suas cordas tenham sempre bom timbre e brilho. Portanto é recomendado trocá-las com mais frequência, digamos uma vez por mês ou até uma vez a cada 15 dias. Se você não toca tanto assim, as cordas podem durar até 2 ou mais meses. Alguns sinais de que as cordas estão "morrendo" são quando elas ficam pretas e os dedos também ficam marcados de pretos depois de tocar, o som que fica"surdo", sem brilho ou pior ainda, ferrugem (especialmente nas cordas de aço).
Alguns cuidados que podem prolongar a vida útil das cordas são: antes de tocar lavar sempre as mãos com sabão. Depois de tocar, limpar as cordas usando um pano (possIvelmente de microfibra) que não solte fiapos e aliviar a tensão nas tarraxas (desafinando o violão) o suficiente para podê-las levantar e passar o pano em volta delas da ponte até o nut corda por corda. Também é um bom hábito repor o violão no case, evitando que as cordas fiquem expostas ao ar e à poeira, etc. Fazendo isso se evita o acumulo de sujeira debaixo das cordas.
Existem também produtos específicos para limpeza de cordas como o GHS Fret, o XLR8 da Planet Waves, o Cleaner da Dunlop, etc. que dão resultados bons, mas é bom considerar que nenhum deles faz o milagre de trazer de volta à vida o som de uma corda enferrujada ou já morta.
Alguns usam produtos como o WD-40 ou outros óleos anti-corrosivos spray, passando um pouco em um pano e passando o pano nas cordas, cuidando para não deixar esse óleo entrar em contato na madeira do violão e da escala (sempre melhor não arriscar!) e isso ajuda também.
É óbvio que a melhor solução continua sendo a troca para um novo encordoamento.
Também um bom hábito é, ao trocar o encordoamento, fazer a limpeza da escala e dos trastes do violão. Existem vários vídeos no YouTube sobre como fazer isso.
Por enquanto é isso. Proximamente irei testando e avaliando marcas de cordas e postarei aqui minhas impressões.
Boa música à todos!

sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Peter Gabriel -"So"


Desde a foto na capa é evidente a vontade do artista de se expor em primeira pessoa, sem uso de máscaras, camuflagens ou imagens distorcidas. A foto, simples e limpa sobre o fundo branco, que mostra o rosto de Peter Gabriel ao natural, livre de artefatos ou máscaras angustiantes, contrasta fortemente com as dos álbuns anteriores: parece transmitir serenidade e convidar a descobrir o "verdadeiro eu" do artista.
Excluindo a trilha sonora de "Birdy" de 1984, já se passaram 4 anos desde "Security", o último trabalho do ex vocalista do Genesis, álbum caracterizado pelo uso pesado de sintetizadores e drum machines.
Estamos em 1986 e muitas coisas aconteceram no percurso artístico de Peter Gabriel. Em primeiro lugar o encontro com o fascinante patrimônio musical africano. Este é o fator que mais influencia as composições de "So". Começando pela escolha dos músicos e da instrumentação: na bateria e nas percussões se destaca o jovem Manu Katche, francês de origem norte-africana que introduz o uso dos "talking drums". Estes tambores, assim chamados porque imitam os sons da lingua africana, permitem criar uma variedade de tons apenas apertando ou liberando as cordas no tambor enquanto estiver tocando. No baixo Tony Levin é garantia de que a música tenha sólidos alicerces; uma seção de sopros comandada por Wayne Jackson do lendário Memphis Horns provê amplo respiro para as composições; David Rhodes, com Gabriel desde 1980, continua no violão; piano, violino, sintetizador, percussões de todo tipo (surdo, pandeiro, congas, triângulo) e backing vocals ampliam o leque de possibilidades sonoras exploráveis e oferecem ao ouvinte uma amalgama de sons variados e sempre interessantes.
O álbum começa com a esplêndida "Red Rain", inspirada por um sonho recorrente de Gabriel: um pesadelo de mares tempestuosos que se transformam em uma chuva devastante e liberatória. Segundo o autor, a chuva vermelha representa todos aqueles sentimentos e pensamentos reprimidos do ser humano que mais cedo ou mais tarde voltam à tona. A voz de Gabriel flutua sobre o baixo hipnótico de Levin, o piano imponente tocado pelo próprio Gabriel e a bateria de Jerry Marotta, para conduzir a um final só voz e piano muito intimista.
"Sledgehammer" é a faixa mais famosa do disco, responsável pelo enorme sucesso comercial de "So". Com a seção de sopros em destaque, um beat irresistível e uma letra claramente alusiva, nas intenções de Gabriel devia ser uma homenagem a certa música soul dos anos '70, de gravadoras como Atlantic e Stax, que ele curtiu muito durante sua adolescência.
"Don't give up", em duo com Kate Bush, intimista e melancólica, é uma canção que traz uma mensagem positiva: nunca desista da vida, mesmo nos momentos mais tristes. Interessante que Elton John declarou que ouvir esta música o ajudou a sair da depressão e largar definitivamente o vício das drogas.
O lado A (porque é de vinil que estamos falando) se conclui com "That voice again", nada de especial, talvez o ponto mais fraco do álbum do ponto de vista compositivo.
A segunda parte do disco começa com a belíssima "In your eyes", onde piano e guitarra realmente grudam no ouvido durante o chorus. A forte base percussiva e a participação vocal de Youssou N' Dour dão um tom de world music a esta composição. "In your eyes" consegue transmitir uma força emotiva extraordinária.
"Mercy street" é outra música bem introspectiva que conta a história de Anne Sexton, uma mulher que, internada por distúrbios mentais, resolveu escrever um livro de poemas e depois de quatro tentativas de suicídio falidas, conseguiu pôr um trágico fim a própria vida angustiada. Provavelmente a música mais sombria do álbum, mas ao mesmo tempo altamente evocativa e de rara beleza.
"Big time" segue musicalmente um pouco na onda de "Sledgehammer", embora não tão contagiante, com uma guitarra funky no lugar dos sopros, os teclados em evidência e Stewart Copeland atrás dos tambores. É uma visão sarcástica sobre a necessidade humana de alcançar o sucesso a qualquer custo.
"We do what we are told", composição muitas vezes executada ao vivo e já conhecida pelos fãs de Peter Gabriel, é aqui finalmente gravada de forma oficial, com sonoridades que lembram o King Crimson de Robert Fripp e certo tipo de música que Bjork gravaria uma década mais tarde.
A última faixa, que curiosamente não é mencionada na track list da back cover do disco, "Excellent birds", é uma boa canção escrita em colaboração com Laurie Anderson.
Para os puristas e os amantes das definições e dos rótulos "So" resulta um disco de difícil colocação, enquanto muito distante das atmosferas prog-rock do Genesis, e não exatamente aquilo que se espera de um disco de pop ou de rock.
Para os amantes da música em geral, "So" é um álbum essencial, rico de sonoridades interessantes que conseguem ir além da época em que foi gravado, aqueles anos '80 muitas vezes alvo de duras críticas. A música nele contida é de fácil acesso e representa o ponto mais alto da carreira de Peter Gabriel.
Á produção de Daniel Lanois é ótima e o vinil tem um som espetacular. O disco, que vendeu milhões de cópias, se encontra facilmente na edição original de 1986 pela Virgin e também na re-edição atual em 180g pela Real World Productions.

quinta-feira, 27 de julho de 2017

The thin red line (Além da linha vermelha) Resenha


Desde as primeiras cenas a narrativa do filme me lembrou muito do "The tree of life", com a voz fora de campo fazendo perguntas retóricas sobre a vida, a morte e tudo que há no meio. De fato, sem que eu soubesse, Terrence Malick é o diretor de ambos os filmes.
Detestei "The tree of life", de 2011. Achei muito pretensioso e sem rumo, embora a fotografia dele seja fenomenal mesmo, beirando níveis de referência absoluta como "Baraka" (só para dar um exemplo).
Mas gostei muito de "The thin red line".
Em 2 horas e 45 minutos este filme de 1998 desenvolve o drama da guerra através da voz dos protagonistas: um grupo de soldados americanos empenhados na sangrenta batalha de Guadalcanal na segunda guerra mundial.
O filme consegue, até melhor que "Saving private Ryan", capturar o desespero, a loucura, a angustia, a dor, e todos os outros sentimentos, quer ditos quer tácitos, dos envolvidos no conflito. Nas entrelinhas "The thin red line" fala mais alto que "Saving private Ryan", que continua sendo meu filme de referência no quesito "filmes de guerra".
É um páreo duro: a fotografia, a qualidade de imagem e as cenas de ação são incríveis em ambos os filmes, com uma levíssima vantagem para "Private Ryan" (a cena da batalha na praia da Normandia continua inalcançada até hoje).
Por outro lado, "The thin red line" oferece mais pontos para reflexão, com personagens mais marcantes, entre os quais Sean Penn, Jim Caviezel, John Cusack, Nick Nolte, Adrien Brody.
Se não houvesse a voz fora de campo com suas perguntas retóricas ("por que nos tornamos assim?", "quem nos separou?", "de onde vem o mal?",etc.) e o lance de "after life", que francamente achei em excesso e pelo visto é característica marcante do diretor, arriscaria colocá-lo no topo. Infelizmente precisa contentar-se com o segundo lugar, junto com "Hacksaw Ridge".
Mesmo assim o filme contém uma poderosa mensagem sobre a inutilidade e os horrores da guerra. Um retrato fiel da alma humana, com suas virtudes e sua podridão.
Vale muuuito a pena assistir!

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Porque ouvimos e colecionamos discos de vinil


Falar sobre as próprias paixões é algo extremamente nobre. Compartilhar nossos sentimentos representa também uma maneira de prolongar o prazer que o objeto de nossa paixão nos proporciona.

O disco de vinil originariamente cumpria uma dupla função: a principal, ou seja a de meio de fruição da música, e a secundária, de objeto, frequentemente também de valor artístico e visual, ao qual atar momentos, lembranças e situações emotivas.
Uma coleção de lps é de fato uma coleção de memórias: é fácil, ao puxar um álbum adquirido 20 ou 30 anos atrás, reviver, às vezes nitidamente, o momento em que foi comprado ou até mesmo o "mood", a atmosfera ligada a ele. Um pouco como as "madeleines", bolinhos em forma de concha que ativaram as reminiscências do escritor francês Marcel Proust inspirando-o a escrever o romance "Em busca do tempo perdido", um dos principais clássicos da literatura mundial. Porque, por mais "piegas" que isso possa parecer, muitos momentos do passado têm um sabor irresistível.
Não podemos esquecer também o gesto de tomar posse de um fragmento de história, uma lasca tangível do tempo que foi: encontrar um velho disco e apossar-se dele equivale a trazer para dentro de casa uma partícula do passado, não necessariamente vivido por nós, em um gesto que é, ao mesmo tempo, celebração do presente e nos torna cúmplices de eventos já desbotados no fluxo do tempo que corre.
São todos elementos de grande valor emotivo que no estado atual das coisas prevalecem sobre o lado prático relacionado com a existência do disco: portanto o disco não é mais apenas um suporte musical (a tecnologia oferece soluções mais práticas), mas acima de tudo um coletor de memórias e sensações, uma espécie de demiurgo da mente.

O disco tem um som delicado nos graves, doce nos médios e aberto nos agudos que afasta anos de compressão selvagem intencionada a por todas as frequências em primeiro plano. No vinil a música respira e vive na dinâmica, que foi a maior vítima dos suportes digitais.
Apoiando a agulha nos sulcos, o disco te obriga a um respeito pela música que de outra forma você não teria e, justo pela delicadeza desta manobra, é impossível o avanço rápido e selvagem característico do áudio em streaming ou do mp3.
Cada mínima partícula de pó influi na música, modificando-a, tornando a audição cada vez única. Quando o disco está muito sujo, é necessário cuidar dele, limpá-lo. É o equivalente áudio do cinema em película. Em uma palavra: mágico.
Mesmo quando ele "pula", cria o paradoxo de fazer você interagir fisicamente com o som, que é abstrato, pedindo sua atenção. É um equilíbrio muito frágil, que dura desde que foi inventada a reprodução do som. Você se sente parte de uma maravilha atemporal.
Tudo isto tem um custo. Se você achar ruim, deveria pensar duas vezes. Desde que usufruímos mais ou menos livremente de toda a discografia de um artista ao alcance de um "click", a música se tornou (não só isso, mas também) database, estatística, passatempo. Quando, ao contrário, você paga pela música, você lhe atribui um valor que te obriga a aproximar-te dela de forma diferente, não mais como algo de corriqueiro, mas algo que vale um preço, que custa uma renúncia. Você é levado a uma escolha (não é possível comprar tudo!) portanto implicitamente a pensar. Quando você escuta um disco pelo qual você gastou dinheiro, você mantém uma atenção que normalmente não tem para uma playlist do Spotify ou um álbum baixado.
Este é o verdadeiro motivo pelo qual nos lembramos perfeitamente da música escutada anos atrás: não porque era mais bonita; simplesmente tínhamos menos discos e os ouvíamos até consumi-los.
A capa, a contracapa, a foto gigante no meio, as ilustrações, as letras, tudo é do tamanho certo para poder ser apreciado plenamente. Não uma adaptação, mas sim um trabalho original, algumas vezes uma verdadeira obra de arte visual.
O disco toca até sem volume, e é aí que está a maravilha: a agulha cria o som mesmo sem amplificação, só trilhando os sulcos. Você aproxima os ouvidos ao disco e ao ouvir aquele som parecido com um gramofone distante você percebe que a musica nasce dali, de um lugar físico. Ela pega forma. Cada faixa possui seu valor: você pode vê-las graficamente esculpidas nos sulcos. Você pode perceber a duração delas e pode entender se uma música começa lenta ou com poucos instrumentos, para depois ganhar intensidade. Você pode ver a música antes de escutá-la.
O disco de vinil é uma forma de apossar-se fisicamente da música. Uma coleção de discos diz quem você é, conta sua história. Por isso os discos são sagrados e precisam ser guardados como coisas preciosas. Não se vendem, não se trocam e nem deveriam ser emprestados.

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

"Coisas para se fazer em Denver quando você está morto"

"Coisas para se fazer em Denver quando você está morto" não obteve muito sucesso na época de seu lançamento em 1995, cúmplice um pouco a "febre" por Tarantino, que com "Pulp fiction" em 1994 havia revolucionado o modo de fazer cinema, e que praticamente monopolizava o interesse de público e crítica naqueles anos.
Contudo, esse filme de Gary Fleder ("Refém do silêncio", "O Juri"), que passou despercebido, merece ser assistido e avaliado positivamente por vários motivos.
Primeiro pela trama.
Jimmy "o Santo" é um empresário interpretado magnificamente por Andy Garcia, talvez no melhor papel da carreira, junto com o de "Internal affairs" ("Justiça cega"), onde divide a tela com Richard Gere.
Os negócios (bastante peculiares) não estão indo bem para Jimmy, embora ele disfarce exibindo um corte de cabelo impecável, esbanje sorrisos e otimismo irresistíveis no rosto e use ternos elegantes. Contudo ele mantém em vida o sonho de poder, um dia, comprar uma lancha e mudar-se para longe de Denver.
Embora hoje ele tente sobreviver honestamente, guarda na gaveta um passado como gangster de todo respeito (o apelido "Santo" vem dele ter frequentado o seminário quando jovem, até perder a vocação e entrar no mundo do crime).
Para salvar sua empresa, endividada até o pescoço, ele se vê obrigado a aceitar executar um "trabalho", na verdade uma "coisinha simples", para o chefão do crime local. Poderia agir sozinho, mas prefere convocar os companheiros dos velhos tempos, que também financeiramente não navegam em boas águas. No meio da operação um imprevisto acontece, a situação precipita e Jimmy, terá que repensar na sua vida e correr atrás do prejuízo. Sentindo-se responsável, tentará salvar o que for possível e consertar os erros cometidos.
O elenco inclui, além da grande atuação de Andy Garcia, que literalmente dá vida a um personagem melancólico, mas ao mesmo tempo provido de bom coração e cheio de alegria (e é impossível não gostar dele!), um notável Christopher Warden, que interpreta o chefão mafioso paraplégico, o tempo todo em uma cadeira de rodas. Um personagem azedo e cínico, amargurado pela vida, que parece ter sido muito má com ele: além da enfermidade, teve que passar pelo falecimento da esposa amada e hoje, o único laço familiar que sobrou-lhe, é o do filho, um garotão seriamente retardado, que vive arrumando-lhe problemas. Da sua mansão,onde ele vive constantemente assistido por uma enfermeira supersexy e cercado pelos seus capangas, ele controla os negócios criminosos.
Gabrielle Anwar (a atriz que dança o tango na famosíssima cena com Al Pacino em "Perfume de mulher") esbanja juventude e sensualidade ao interpretar Dagney, a linda jovem que conquista o coração de Jimmy. A química entre Gabrielle e Andy é muito boa, o casal protagoniza algumas cenas memoráveis.
Todos os personagens são bem construídos, ao ponto de alguns parecerem personagens de quadrinhos, com características peculiares mas não estereotipados. O diretor desenvolve com grande habilidade o psicológico deles.
"Critical" Bill (Treat Williams), um dos parceiros de Jimmy, é um brutamonte violento e asqueroso com sérios distúrbios mentais que treina boxe batendo em cadáveres; Olden (Christopher Lloyd, o "Doc" de "De volta ao futuro", o mais idoso da turma, ganha a vida projetando filmes em um cinema pornô; Lucinda (Fairuza Balk) é uma jovem prostituta que sonha em um dia ter um filho com Jimmy e vive pedindo dinheiro emprestado; Steve Buscemi é perfeito como killer silencioso e frio, a morte personificada, uma figura dificilmente esquecível, mesmo tendo importância marginal no contexto da história.
É muito interessante assistir à luta que os personagens terão que travar para arcarem com as consequências das próprias ações e que os levará para os próprios destinos.
Outro elemento de destaque deste filme é a linguagem muito peculiar, repleta de gírias e expressões quase incompreensíveis e de difícil tradução ("boat drinks", "mammy-rammer", "give it a name", "buckwheats"), os diálogos afiados e crus que tornam a história mais real e às vezes puramente trash. Algumas falas são inesquecíveis ("Eu sou Godzilla, você é o Japão!")
Mas atenção: não se trata apenas de mais um filme de gangsters ou de pura ação. Nas cenas e no desenvolver dos eventos é recorrente o tema da fragilidade da vida, da frustração da mortalidade e a angustia da iminência da morte, o que leva a refletir sobre nossas ações, sobre nossa existência, não apenas na dimensão presente dos fatos cotidianos mas também em perspectiva futura, visando o tempo em que não mais estaremos aqui.
Com muito bom gosto Fleder insere na trilha sonora algumas pérolas de Tom Waits, Johnny Cash, Morphine e Buddy Guy, que muito oportunamente ajudam a descrever algumas cenas de forma mais viva e dinâmica.
Sem mencionar a cena final, tão linda que chega a dar um aperto no peito.

quarta-feira, 12 de junho de 2013

O pulo do gato na limpeza dos discos de vinil (custo/benefício impressionante!!!)

É um fato inegável: a reprodução musical depende muito das condições dos suportes áudio que contém as informações sonoras. Um cd arranhado, um disco de vinil sujo ou até mesmo um pen drive ilegível podem tornar a audição de música um pesadelo quando na realidade deveria ser um prazer.
Pensando em som analógico (os bons e velhos bolachões) desenvolvi esse guia que espero possa ser de ajuda na busca do melhor som possível.
Como já escrevi em outro post, existem inúmeras maneiras de limpar os discos de vinil, e todas buscam o mesmo objetivo: tornar a experiência analógica o mais prazerosa possível. Um disco de vinil, se bem cuidado e em boas condições pode proporcionar um som de altíssima qualidade. Ao contrário do que muitos pensam, os "bolachões" podem manter uma qualidade de som excelente por dezenas de anos, desde que limpos e armazenados em condições ideais. Aqui vou ensinar o método de limpeza que realmente representa o "pulo do gato", que garante resultados comparáveis aos obtidos por lavagem com máquinas profissionais tipo VPI, Nitty Gritty, etc. E isso com uma relação custo/benefício INACREDITÁVEL!
Trata-se de um sistema baseado (como as máquinas acima) em SUCÇÃO. Esse sistema é de fácil realização e garante o mesmo resultado que as máquinas de lavar vinil e o melhor é que você não precisa gastar centenas de dólares por isso!!!
Discos de vinil na maioria dos casos costumam ter uma certa idade. Pela próprias natureza a tendência é acumular estática, poeira, sujeira de todos os tipos e às vezes até mofo que se deposita nos sulcos microscópicos, às vezes de forma invisível, causando uma reprodução cheia de interferências e um som abafado com graves embolados e agudos pouco extensos.
O que é pior é que muitas vezes até discos que ao olho nu o disco se apresentam limpos, sem riscos ou arranhões, mesmo apesar de todo tipo de lavagem, na hora de tocar são um desastre. O som não sai limpo. Isso é porque os demais métodos de limpeza que não sugam a sujeira dos sulcos dos discos não fazem mais do que espalhar a sujeira da superfície de um lugar para outro no disco. Por isso o som continua ruim.
Aqui está o segredo: a SUCÇÃO. Nesses últimos dez anos tentei de tudo (às vezes com discretos resultados), mas nunca encontrei um método que transformasse o som dos discos de vinil tão radicalmente como esse que estou postando aqui.
Em primeiro lugar quero deixar bem claro que esse método não serve para discos surrados, cheios de arranhões ou riscos profundos (contra esses não há remédio, portanto cuide de seus discos!!!), mas com certeza vai dar nova vida àqueles discos sujos ou até mesmo que aparentam estar limpos e que paradoxalmente tem um som horrível, cheio de "plocs", ruídos e com médios/agudos abafados. Esse sistema devolve o prazer do mais puro som analógico. E o legal é que isso pode ser obtido com uma despesa realmente irrisória!

Tudo que você precisa é:
- Um aspirador de pó e água
- Dois borrifadores
- Álcool isopropílico
- Detergente neutro para louça (tipo Ypê, Minuano, Limpol,etc.)
- Água destilada ou deionizada ou purificada (se encontra em farmácias ou postos de gasolina e lojas de produtos automotivos)
- Um pincel de cerdas macias (daqueles usados para pintar paredes, madeira, etc). Eu uso um de 3-4 cm de largura.
- Um pano de microfibras (mas se não tiver não importa)
- Tiras de feltro adesivas (se encontram em lojas de material de construção e são bem baratas)
- Uma superfície lisa que não possa ser aspirada sobre a qual apoiar os discos.

Agora vamos ao trabalho!
Pegue uma terminação de aspirador (eu uso uma em forma de "t", a da foto) e corte tiras de feltro adesivo retangulares para que cubram a inteira extensão da ponta (o aspirador tem que passar na superfície do disco sem causar o mínimo arranhão). Certifique-se de não obstruir o canal aspirante e que o feltro esteja bem fixado ao plástico da ponta do aspirador. Faça um teste passando o aspirador (ligado, obviamente!) em cima de um disco ruim ou em péssimas condições. Veja se o feltro adere à superfície do disco. O disco deve grudar no aspirador. Mexa com movimento circular pra ver se o aspirador passa suavemente sem causar arranhões (não deveria visto que o feltro amortece a fricção do plástico com o vinil).

Agora você precisa fabricar a solução de limpeza.
Essa é a receita que eu pessoalmente uso, que muitos audiófilos do mundo inteiro recomendam e que na minha opinião proporciona resultados sensacionais. Você pode ser mais exigente e encomendar um produto comercial importado tipo Discwasher ou L'art Du Son no Ebay, procurar outras receitas na net ou também nada impede que você crie sua própria receita caseira, utilizando outros produtos. É muito legal experimentar novas soluções e chegar com uma ideia nova!
Misture água destilada com álcool isopropílico na proporção de 70/80% de água e 20/30% de álcool. Faça uma quantidade que seja suficiente a preencher um borrifador. Acrescente uma ou no máximo duas gotas de detergente neutro, (mas não mais que isso!) e chacoalhe. A função do detergente é apenas de quebrar a molécula da água para que ela possa penetrar mais facilmente nos sulcos.
Encha o outro borrifador de água destilada PURA que servirá para o enxágue.

LAVAGEM, ENXÁGUE E SUCÇÃO:
Coloque o disco em cima da superfície lisa com o lado A para cima. Cubra o selo com alguma coisa plástica e redonda para não molhá-lo. Borrife bastante solução de limpeza em cima do disco e com movimentos circulares passe o pincel em volta do disco. Não precisa fazer muita pressão, passe bem levemente. Pode passar nos dois sentidos, você vai ver que se formarão umas pequenas bolhas brancas no disco todo. Você está removendo a sujeira dos sulcos do vinil! Está na hora do enxágue.
Pegue o outro borrifador e enxágue o disco borrifando bastante água destilada. Cuidado com o selo!
Agora a parte melhor, a que faz toda a diferença: a sucção. Ligue o aspirador e segurando o disco pela borda com um pano de microfibras levante o disco e mantendo-o inclinado comece a aspirar rodando o disco com a mão esquerda. Você vai ver que o aspirador sugará o liquido da superfície do disco que ficará limpa e seca em poucos instantes. A medida que o aspirador for secando o disco você vai perceber que ele começa a exercer mais pressão em cima da superfície do vinil. É sinal que o liquido foi completamente aspirado. Duas voltas inteiras são suficientes para deixar o vinil perfeitamente seco. Se no fim do processo ao afastar o aspirador do disco aparecerem umas gotículas, você pode retirá-las absorvendo-as com o pano de microfibras.
Vire o disco e repita o processo para lado B.
Se ao término desse processo o selo estiver seco, parabéns!!! Caso não estiver, espere até ele secar e aí o disco está pronto para ser colocado em seu celofane ou ainda melhor para ser tocado! Em muitos casos porém os selos terão algum resíduo de água. Nenhum problema, deixe secar naturalmente ao ar, é questão de poucos minutos.
Pronto! Agora seus discos tocarão como nunca antes e suas audições serão mais prazerosas! mantenha sempre seus discos limpos. Lave até os discos novos! Sempre lembre-se de armazenar seus discos em posição vertical em um lugar areado e seco.
Espero seus comentários aqui!



Nota: Andei experimentando ainda mais e achei que usar abrilhantador secante para lava-louças (se encontra em qualquer supermercado, o da Sun ou Limpol custam R$ 6 a embalagem de 100ml)é melhor que o detergente comum para pratos, pois trata-se de um produto menos agressivo e que desenvolve o mesmo papel, sendo um tensioativo (ou seja, quebra a molécula da água e tem alto poder limpante). Bastam poucas gotas misturadas a solução de água destilada e álcool isopropílico. Podem experimentar também variando as proporções de álcool e água destilada, tentando diminuir a quantidade de álcool (acho que podemos chegar a 5-10% tendo ótimos resultados!)